sexta-feira, 15 de janeiro de 2010
HERANÇA
De ti não só herdei os meneios, como o olhar distante,
A necessidade de permanecer só, a beleza inconstante...
De ti herdei as perdas, os degraus do antigo casarão, o desejo de desvencilhar-me das correntes que me aprisionam a alma.
De ti herdei os gestos repetitivos e incansáveis, a insanidade das buscas antigas e tão distintas, precisas e tão fulgazes...
De ti herdei o medo eo apego pelas coisas frágeis.
De ti herdei o tanto que larguei pelo caminho...
segunda-feira, 11 de janeiro de 2010
CUMPLICES
Olhavam-se por horas... Buscavam um alento, algo mais que um olhar.
Sentiam-se bem um com o outro... Às vezes nem mesmo as palavras faziam falta.
Era bom ouvir o silêncio de cada um. Entendiam-se mais...
Não. Nunca houve dúvidas.
Havia sim, o medo de que o tempo, fosse novamente o algoz de suas vidas e acabasse com as suas fantasias...
Haviam sofrido. Ah! Sim, esse era um detalhe importante. Em alguns a entrega não deixa marcas tão profundas, mas com eles tinha sido diferente... Eram sensíveis, muito sensíveis, e embora essas marcas hoje fossem apenas cicatrizes, ainda queimavam, ainda ardiam insistentemente, lembrando-lhes um passado não muito distante.
Mas eles eram felizes quando estavam juntos. E não precisavam de muito, na verdade eles tinham exatamente tudo o que precisavam quando estavam juntos... Eram adultos, eram crianças, eram frágeis e fortes...
Eram belos! De uma beleza singular, porque assim se viam, absolutamente cheios de defeitos, mas acima de tudo humanos. Admiravam-se.
Ele não entendia bem o que a encantava, muito menos ela, o que o atraia, mas ambos sabiam exatamente o que possuíam no outro, e era tanto de cada um!
Muitas vezes flagravam-se tão permissivos e riam, por que a permissão nunca foi exatamente o forte dos dois, mas quando estavam juntos era diferente... Tudo era diferente...
E o que há de mais encantador nisso tudo: é que não houve exatamente um começo, e pelo que sinto como mera observadora, não terá fim...
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
Amor eterno
Sim!
Eu quero dar-te o prazer dessa dança...
Perdoa-me! Não há como poupar-te das lágrimas
Que insistem em rolar-me as faces.
São as lembranças...
Tão fortes agora. Lembro-me de ti,
Quando eu ainda era risos e a juventude em flor
Fazia-se mulher em mim a cada amanhecer
Desvendando-me...
Sim, como negar?
Aceito o teu convite para dançar.
Acolhe-me agora em teu peito
Envolve-me, que o teu braço forte
Será o repouso desse corpo cansado,
Mas ainda vivo!
Escuta a melodia singela...
Sim.
Eu quero dar-te o prazer dessa dança!
terça-feira, 5 de janeiro de 2010
ES PE RAN ÇA
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança…
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...
* Mário Quintana In: Nova antologia poética *
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