"... tinha suspirado, tinha beijado o papel devotamente! Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades, e o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas, como um corpo ressequido que se estira num banho tépido; sentia um acréscimo de estima por si mesma, e parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante, onde cada hora tinha o seu encanto diferente, cada passo condizia a um êxtase, e a alma se cobria de um luxo radioso de sensações! "

Eça de Queiroz - O primo Basílio

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

APELO



Quero um colo.
Um amparo para o meu cansaço.
Que me vejam fraca, exausta mesmo, sem máscaras,
Pura e simples na dor que carrego.
Quero gritar, chorar,
Esvair-me de todas as mágoas,
Quero a permissão até o meu contentamento,
Quero o desespero...
Quero despencar e ser compreendida.
Não busco a piedade,
Nem a inquietação que me reprima.
Apenas o silêncio e o olhar sincero.
O Perdão, não! O perdão eu não quero.
Prefiro deixar que doa, que sangre, que sofra...
Sentir-me plena nessa agonia.
Expurgar...
Depois quero o descanso,
O precioso egoísmo dos seres humanos
que se queixam das dores pequenas.
Amanhã acordarei a ouvir os lamentos,
Os apelos...
Hoje não!
Hoje, eu quero esquecer a dignidade,
Os pudores.
Hoje preciso perder a razão,
Causar desconforto e, simplesmente,
Ter um colo.

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